18 de jul. de 2019

SUPRANACIONALIDADE COMO CONSTRUÇÃO DE VARIÁVEIS INTERVENIENTES



SUPRANACIONALIDADE COMO CONSTRUÇÃO DE VARIÁVEIS INTERVENIENTES
Supranationality as construction of intervenient variables
VIGNA, Edélcio Vigna
Resumo: A proposta deste artigo é levantar a questão que a supranacionalidade não decorre apenas de uma variável, de tratados e acordos, que determinam áreas comuns de comércio, mas de outra série de variáveis e fatores, que podem ser concebidos como variantes teóricas e intervenientes. A supranacionalidade, neste artigo, é conceituada como uma relação entre identidade e territorialidade regional, que comporta elementos mais subjetivos do que objetivos, evitando, assim, uma leitura positivista, funcionalista ou estrutural-funcionalista. Os diversos fatores constitutivos da supranacionalidade, perpassam diversas dimensões e propõem uma nova forma de resistência contra a colonialidade gerada pela episteme neocolonialista euroamericana, que se impõe por meios mediáticos, culturais e estruturais.
Publicado em: REALIS, v.8, n. 02, Jul-Dez. 2018 – ISSN 2179-7501
https://periodicos.ufpe.br/revistas/realis
file:///C:/Users/Dell/Downloads/231410-143584-1-PB.pdf

5 de fev. de 2018

Cryptolocker e ransomware, conhece?

(Conspiração para participar da atividade de Rackers; Fraude bancária; Conspiração para violar a Lei de fraude e abuso de computador; Conspiração para violar o ato de identidade de roubo de identidade e dissuasão de suposição; Roubo de identidade agravado; Conspiração; Fraude informática; Fraude de Comunicação; Lavagem de dinheiro).

Cryptolocker e ransomware, conhece?
Edélcio Vigna, doutor em Ciências Sociais/UnB

Ainda precisamos invejar a carapaça do jabuti. Porque mesmo criando uma couraça tecnodigital continuamos vulneráveis. Temos a falsa impressão de que o mundo fica lá fora, fora da matriz que construímos cotidianamente. O nosso refúgio, construído de bits e pelos modelos dissipáveis ou auto-organizáveis, é somente um jogo de sequencias infinitas.

Despejamos fotos no instagram, no facebook, recebemos cliques de autoestima e respondemos com emojis.  Mas, em verdade nosso corpo social está sendo roubado. Estamos sendo amputados dos sentimentos. O ciberespaço suprime o planeta. A globalização é incapaz de nos dar a territorialidade que necessitamos para existirmos como identidade cultural.

Onde está aquela casa cheia de sonhos? Realidades vividas, experiencializadas, por nossos pais e por nós desde pequenas quimeras que fomos? Estamos atravessando um patamar que oferece uma tirania cibernética muito mais hedionda que o esquecimento.

Eu me recuso a ser formado por bits. Minhas células se rebelam contra o cyber-darwinismo. Para fugir da indiferença em relação ao outro, não posso eliminá-lo, mas colocá-lo ao meu lado.

A bolha informática, similar a rosa de Hiroshima, não nos ameaça como ficção, mas com a realidade da crise da neteconomia, que não tem lugar nem espaço para explodir. “No dia em que todos os bancos e bolsas do mundo estiveram interconectados, o crack será necessariamente mundial”, alerta o filósofo Paul Virilio.

O principal problema não é o cyber isolamento que dessujeita, que criou o não-sujeito, mas a ilusão da interação protetora. Nos muitos cliques existe o nada. O que há não é o caos, mas a desordem. No caos há possibilidade criativa, a desordem é estéril. A violência ganha nova forma. O trágico espetacular tem início com a destruição das torres gêmeas.

Quem é o alvo do rinocibernético? Os aeroportos, bancos, governos e você. Em maio, o “cryptolocker”, um vírus de resgate, bloqueou mais de 200 mil computadores em 150 países, entre eles a Inglaterra, Rússia, Dinamarca, França, Ucrânia, e Espanha.

Outro vírus o “ransomware”, sequestra os arquivos e só os libera mediante pagamento em moedas virtuais. Um ataque cibernético consume milhões de dólares. Para evitar o “Bug do Milênio” foram gastos US$ 7 bilhões.


Não nos basta a carapaça do jabuti, símbolo de resistência cultural brasileira, que desafia o tempo com a astucia que a floresta lhe proveu, para nos livrar da crise da neteconomia. A pergunta não é se ela vai acontecer, mas quando acontecerá? Enquanto o armagedom não vem é melhor atualizar seu dicionário com os termos do novo tempo. 

O escritor e seu escritório

O escritor e seu escritório
Edélcio Vigna, doutor em Ciências Sociais (UnB)
Em certa cidadezinha do interior morreu um escritor muito conhecido na região.
O prefeito pensou em criar na biblioteca da única escola do município, um espaço que reproduziria o escritório do famigerado escritor, que tantas crônicas publicou no jornal local. Porém, um surgiu um problema: o escrevinhador morava sozinho e as pessoas desconheciam o local em que ele escrevia.
A família, que morava longe tinha levado em um caminhãozinho baú, os poucos móveis e deixara a casa vazia. Os textos originais, que entregava ao editor, era datilografado. Seria em uma Remington 30, daquelas antigas ou em uma Olivetti elétrica? Os caracteres eram de máquina de escrever, afirmava o editor. 
O prefeito mostrou os originais ao professores e aos eruditos do município. Como não houve consenso, foi realizada uma reunião, às pressas, com os mais instruídos munícipes. Nenhum reconheceu o tipo de impressão. A eventualidade dele usar um computador ou um notebook estava fora de questão.
Como resolver esta questão principal na montagem o escritório? Uma possibilidade seria entrar em contato com a família e perguntar. Porém, ninguém sabia onde a família morava. Nesta situação, palpitou o dono da banca do jogo de bicho, é criar um ambiente de escritor.
A sugestão foi bem recebido. Contudo, cada participante, do farmacêutico ao delegado, imaginava um tipo de recinto. Coisas consensuais: tinha que haver uma mesinha e um cadeira. Todavia, o que haveria sobre a mesa? Um livro? Dicionário? Tinteiro? Caneta, lápis, uma pena de bico?
Bem, mas que tipo de mesa e de cadeira? Rococó, moderna ou barroca? A discussão voltava ao início. A madrugada já ia longe quando resolveram indicar algumas pessoas para pensar o “escritório” e, no dia seguinte, se reuniriam para os acertos finais.
Por fim, o “Espaço do Escritor” foi inaugurado. Recolheram uma mesinha do depósito da Prefeitura, colocaram uma caneta Parker tinteiro, um tinteiro, um mata-borrão, uma máquina de escrever das antigas e um óculos antediluviano do farmacêutico. Um dicionário e uma Bíblia.
Acontece que, em uma cidadezinha, todos sabem de tudo e a farsa virou piada. Diante do mal-estar, o prefeito mandou retirar o “escritório” e guardar tudo no depósito municipal.
Gerações se passaram e a história foi esquecida. Certo dia, um antigo funcionário lembrou que no próximo mês completaria 100 anos da morte do ilustre escritor. Informado o prefeito e mandou preparar uma semana de atividades literárias em homenagem ao falecido letrado.
Reservou um lugar de honra na biblioteca municipal e resgatou o “Escritório do Escritor” do depósito municipal. O canto, escolhido pela Dona Lurdinha, bibliotecária aposentada, foi cercado por cordões dourados e vermelhos e amarrados em balaústres barrocos finamente ornados.

As palestras da Semana foram um sucesso e a preleção inaugural feita por Ariano Suassuna, consagrou os móveis, as canetas, o tinteiro e os livros, como peças originais. Verdadeiras heranças do escritor àquele cidade, que tanto necessitava de um símbolo literário para se firmar como centro da região. 

8 de dez. de 2017

Elites discutem apoio a Lula


Elites discutem apoio a Lula
Edélcio Vigna, doutor Ciências Sociais/UnB
As elites dominantes estão discutindo o apoio a Lula. As confederações industriais, as associações de banqueiros internacionais e as multinacionais de serviços e investimentos estão recompondo suas posições com respeito as eleições presidenciais de 2018.
As assessorias dessas empresas estão repensando os fatos políticos ocorridos desde o impeachment de Dilma Rousseff. Para eles o jogo das grandes elites foi o de substituir Dilma por Temer, para que este executasse as políticas regressivas necessárias e, em seguida, voltar com Lula para que este retomasse (ou retome) o modelo capitalista popular de consumo.
Dilma não poderia implementar as políticas recessivas, pois colocaria em risco a candidatura de Lula, que preencheu as expectativas do mercado financeiro e industrial internacional. A elite internacional teve que apostar em duas linhas temerárias em tempos diferentes: colocar em marcha uma manobra arriscada como a substituição de Dilma por Temer; e depois, impedir que Lula sofresse (ou sofra) alguma sanção que o impeça de se reeleger em 2018.
Não interessa para as multinacionais o tipo de mercado nacional restritivo que as políticas recessivas desenvolvem, porque não estimulam o consumo de média e baixa renda. O mercado em vez de se expandir, ele se contrai impedindo um lucro crescente no mercado interno. Os novos ricos, que se beneficiaram com a expansão do mercado na época anterior, não capitalizam o mercado interno, pois preferem fazer compras em Miami e na Europa.
Esse gasto no exterior, da nova classe endinheirada, prejudica o desempenho das franquias internacionais e das multilatinas, que preferem a volta do mercado consumidor de média e baixa renda. Diante aprovação da reforma trabalhista, que era o maior empecilho, em termos de custos sociais, essas empresas estão avaliando positivamente a volta de Lula, como uma retomada do mercado consumidor, com juros baixos.
A elite internacional não confia nos nomes que estão sendo colocados como candidatos a presidentes, independentemente de partido político. Lula já fez um acerto, em 2004, com os grandes do mercado internacional e, por isso, é um nome confiável, que cumpre os acordos realizados. Os demais nomes são incógnitas, em termos de gestão política, e o mercado não suporta surpresas.
Neste contexto, de acordo com os analistas internacionais, Lula manteria a margem de 30% de intenções de votos e não provocaria abalos internos no PT, uma vez que sua corrente interna majoritária “Construindo um Novo Brasil”, não se opõe à implantação de um modelo de mercado capital-consumidor.
Neste panorama, caso se concretize a candidatura de Lula, os demais concorrentes terão poucas chances de vitória. Agora a disputa passa a ser jurídica e vai continuar até a última hora, pois mesmo condenado Lula poderá recorrer e garantir sua permanência no jogo eleitoral.
Os especialistas concluíram que é preciso esperar a decisão do TRF, em Porto Alegre, que ainda vai analisar os recursos do Ministério Público e da defesa de Lula. As convenções partidárias que escolherão os candidatos serão realizadas a partir de 20 de julho, e Lula, mesmo registrado, pode ser cassado pelo TRF. Caso concorra e ganhe a eleição ainda pode ter seu diploma anulado. Só não pode ser cassado caso assuma a presidência no dia 02 de janeiro de 2019.
A Ciência Política nos ensina que pouco se sabe sobre as inumeráveis variáveis que interferem sobre o resultado final de um conflito, no qual Maquiavel já não passa de um amador. Essa é uma disciplina, que não compete a diletantes, é uma matéria em que uma das variáveis principais, no sistema capitalista contemporâneo, não é a ideologia, mas o mercado internacional.


Cuidado com aquele que bate à Porta



Cuidado com aquele que bate à Porta
Edélcio Vigna, Doutor em Ciências Sociais/UnB 

A sociedade não se reproduz a partir de um único discurso. Ao contrario, o pensamento único paralisa o desenvolvimento e a criatividade. A imutabilidade social é um discurso ideológico do homem conservador e subalterno. A humanidade se desenvolve por meio de situações conflitivas, que emergem como oportunidades de crescimento ético e moral.

Os discursos rarefeitos, como o jurídico e médico, por exemplo, estão restritos às sociedades dos discursos como os mais parciais e, portanto, necessitam de significações superadas para se justificarem nos tempos atuais. O discurso médico, além do diagnóstico, já avançou ao recepcionar novas técnicas e outras terapias, em especial as orientais.

O advogado e seu discurso “Juridiquês”, são duas criaturas siamesas produzidas pelo século XVIII, que se originou frente aos abusos das monarquias constitucionais. Desde o setecentismo, os advogados, com raras exceções, vem se aventurando no campo político. Porém, mesmo vivenciando a prática política ainda lhes falta competência teórica para intervir nesse espaço.

Quando um advogado ou um médico toma a palavra para fazer análise conjuntural é um Deus nos acuda. Há advogados e médicos, que se destacaram como políticos brilhantes, mas essa competência não é atribuída a todos esses profissionais. Isso não é um demérito, é apenas uma comprovação.

Observe como alguns juristas da mais alta corte se tornam objetos de chacotas nacional. O problema não é utilizar, de forma equivocada, categorias da ciência política, mas de desconsiderar que por trás de cada expressão há um significado ideológico, que não permite a neutralidade. A análise conjuntural não é neutral e dela ninguém sai impune, nem os cientistas políticos.

A retórica é arte de ludibriar o outro. Essa arte, que os pseudo-intelectuais utilizam para impressionar, foi expulsa do paraíso dos discursos junto com os sofistas gregos. A retórica é uma técnica utilizada pelos vendedores de ilusões. Portanto, cuidado com aqueles que batem à porta.

O neosofista, o novo enganador, utiliza-se de dados que não podem ser comprovados. Fala do que desconhece sem o mínimo constrangimento. Afirma absurdos e relaciona o que não pode ser relacionado, certo que a torrente de tolices, que lhe sai da boca ou da escrita, impede o pensamento crítico e lhe garante a impunidade.

São exímios em afirmar coisas no vazio da realidade. São como os loucos, que veem em toda manifestação a comprovação da sua verdade. Ao juntar essa patologia com a fúria de tudo que lhe é diferente ou que lhe contradiz, teremos o rancoroso indivíduo da direita ou da esquerda política. Há algo de hitleresco nestas pessoas. Ambos tem como porto final o totalitarismo.


O novo discurso emancipador, ideológico porque propõe uma ação mudancista, tem como objetivo propor caminhos, saídas ou consensos. O discurso conservador, por seu lado, rarefaz as possibilidades de que o desigual sobreviva, estreita as portas e aferrolha as janelas, para que o ar do amanhã não circule e revolva o calendário. 

Quando não se pode mais deixar de Escrever


Quando não se pode mais deixar de Escrever
Edélcio Vigna, doutor em Ciências Sociais/UnB

A situação política ia tão mal governada que não escrevi nada depois do golpe contra a Dilma Rousseff, porque queria deixar a poeira abaixar. Mania de historiador, dar tempo ao tempo, pois ele é o mais sábios dos conselheiros (Plutarco).
Passaram alguns meses, Michel Temer tomou posse, e continuei sem escrever uma linha. Depois das delações o golpe ficou evidente. As máscaras caíram e veio à tona a construção de anos de um sistema de corrupção pela patifaria governamental, parlamentar e jurídica.
Escrevi um artigo “O golpe ‘temerdoriano’ ou o 18 brumário brasileiro” para a Revista de la Red Intercátedras de Historia de América Latina Contemporânea (RIHALC). Publiquei (http://del-vigna.blogspot.com.br/2017/04/o-golpe-temerdoriano-ou-o-18-brumario.html) e fiquei atento aos sucessivos episódios repulsivos, pelos quais caminham a história política brasileira. Meu instinto sociológico – guiado pelo tempo dos acontecimentos – superou o tempo da longa duração da história e escrevi outro texto.
O tempo, que tinge nossos cabelos de branco, nos ensina a escrever sem ódio ou mágoa. Tenho lido artigos inflamados de adjetivações e frases cansadas que se fazem parecer inteligentes. Respeito as diversas posições políticas. Creio que sem essa diversidade a história política não avançaria. Só me desagrada a grosseria, que ofende a língua portuguesa e a inteligência dos leitores.
Ressaltei, no artigo para a revista mexicana, que a análise ficaria inacabada “considerando que a disputa se prolongaria até as eleições presidenciais de 2018”. Essa impressão se mantém atual porque não indicarão os rumos futuros. A vitória de uma coalizão partidária, que se manterá no poder por um determinado período, perderá a força progressista ou conservadora. Isso porque a História se faz no cotidiano. 
Desde que Stefan Zweig escreveu o livro “Brasil, País do Futuro”, a intelligentsia nacional tem deitado sobre berço esplêndido esperando o futuro. Desde que a Graúna, de Henfil, perguntou “que país é este?”, as réplicas foram tantas que ninguém sabe a resposta certa ou cada um tem a sua, pessoal ou de classe.
A cada quatro anos os eleitores são convocados a votar e, em seguida, se deprimem, porque não votaram em um projeto de futuro. Votaram como indivíduos atomizados e se esqueceram dos nomes dos candidatos escolhidos.
A mídia se apressa em reforçar que o sistema eleitoral e político só precisa ser reformado e não revolucionado. Que a compra e venda de votos entre parlamentares e Executivo é normal e a prática da corrupção existe em todo mundo. É uma deslavada lorota, mas os ancoras que anunciam tal mentiras, como verdades, são protegidos pelas telas da TV. A história ensina que o que é construído pelo homem, pelo homem pode ser demolido.

Somos a ponta do iceberg que há mais de 500 anos reclama um Titanic. Os sistemas são tão momentâneos como são as nossas opiniões sobre a conjuntura atual. A diferença é que nós refazemos nossas convicções, enquanto que os que detém o poder de manter o sistema reafirmam a certeza de estarem apenas cumprindo o dever ao jogar bombas de gás e atirar, com balas de borracha, em nossos filhos.